segunda-feira, 23 de junho de 2008

Sobre Meter Colheres

O prédio do colégio tem seis lances de escada. Cada degrau que o menino desceu – um por um, com suas pernas curtas -, ressonou como o tic-tac de um relógio: Seu pequeno cronômetro pessoal marcava a, infeliz, contagem regressiva. Lá em baixo já havia o som da boca da professora - não o das palavras que soltava, lançadas aos ouvidos da mulher já nervosa; mas o som diminuto de cada gotícula de cuspe, dessas que fogem do estômago em momentos de discurso inflamado. Como uma espécie de dinâmica fisiológica, cada reclamação emanada, vazava áspera pelos tímpanos da mulher frente à escada, e assim, logo transformava-se em algum tipo de material etéreo, que deixava os olhos dela cada vez mais vermelhos. Três, dois, um: O pé do menino no chão, a mão de sua mãe em seu rosto. Numa situação delicada, não é difícil presumir a necessidade de um bom primeiro argumento. O dela foi um forte, muito forte, tapa na cara. O som ecoou no hall de entrada, alto como bombinha. Além dos dedos tatuados na bochecha, o menino, sem tirar os olhos da mãe, notou a energia dos olhares em sua volta: Uma atmosfera omissa, que só reverberava o som daquele ato. Foram cerca de dez minutos de gritos a um palmo de distância do rosto, de socos e tabefes, nos braços e na face; mais que isso: Na alma. Ficou claro quando, finalmente, o inevitável aconteceu. Uma pequena e tímida lágrima caiu do cantinho de seu olho esquerdo, deslizou pela bochecha, bem breve, ao cruzar seu rosto. Depois de seiscentos segundos...

Será que ele não vai mais matar aulas? As conseqüências desse ato, tenho certeza, irão muito além da hora da chamada. Eu mesmo, que apanhei quando pequeno, sinto hoje vontade de resolver isso na porrada. Reflexo. Mas como eu poderia explicar praquelas duas?

- Senhoras, não; isso não é, como se diz?... Pedagógico.

Uma é a mãe, a outra a professora...

4 comentários:

  1. êba!!!Igor na área...

    Já se familiarizou?

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  2. Eu tava com medo de postar aqui.


    Aliás, eu ainda to, mas já foi, agora já era, rs

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  3. igor, primeiro: lindo texto. muito bonito. sensível, literário. lindo.
    segundo, a situação: realmente, dá vontade de resolver na porrada. e olha que eu não lembro de ter apanhado uma vez sequer na minha vida.
    abraço,

    rodrigo, em dias de tolerância zero - também tenho os meus.

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  4. Só pra quem não sabe... O Igor escreve muito lindo e tem uma criatividade fora do comum, mas infelizmente, esta cena não é fruto de sua imaginação. Atualmente, ele trabalha como secretário numa escola estadual. Educador, portanto, que todos os adultos implicados na educação escolar são educadores - ainda que se recusem a assumir esta condição, como quase todos os adultos se recusam a assumir qualquer coisa...
    A cena foi presenciada por ele na segunda semana de trabalho!

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