segunda-feira, 2 de junho de 2008

O Educador Brigante / Crise Pedagógica

Que, é bem possível, tem a ver com outras crises, tem a ver com dúvidas existenciais de muitas ordens, tem a ver com o inferno astral. Mas queria aproveitar este espaço aqui pra discutir uma crise pessoal que foi semeada no início do ano letivo, quando iniciei a participação no curso "A arte do Brincante para educadores", ficou em repouso, entre uma gestação e uma negação aberta de seu desenvolvimento, mas que agora bateu bem forte e está me incomodando pacas. No espaço Brincante, na Vila Madalena, malgrado minha estupefação diante das aulas, que são maravilhosas, já consegui ficar mal-vista (como de resto, em todo lugar que eu freqüento desde que nasci). É que uma das expositoras, mulher muito inteligente, apresentou paralelamente ao curso de cultura brasileira como que um mini-curso de sua concepção pedagógica. Aquilo me desagradou profundamente. Não a ponto de servir para desqualificar seu trabalho, sua pesquisa, sua pessoa, em última instância. Mas me pareceu, mais uma vez, que toda a crítica que ali se fazia à escola e ao ensino tradicional ignorava dois pontos funcamentais para se pensar a escola pública possível: a questão que o Zé Sérgio levanta da necessidade de se assumir o papel de autoridade, por um lado, e, por outro, mais simplesmente, a questão de classe. Sim, me incomodou muitíssimo, e sempre me incomoda, que qualquer crítica e qualquer alternativa que se pretenda alternativa não assuma como seu o problema da educação democrática e popular. Então, evitei o quanto pude ser desagradável, me restringindo ao ponto do lugar da autoridade, e apenas resvalando na questão de classe quando dizia: "há que se ter em mente o problema disciplinar quando se pensa uma turma de quarenta alunos, que é a turma média da escola pública brasileira...". Dizia isso em contraponto à afirmação de que todo ensino tem que ser lúdico, que a criança deve conduzir o processo, etc. etc. Lembro de chegar a ter dito o que atualmente é o mais próximo da minha opinião: que seria favorável a todo este discurso do lúdico e de uma relação prazerosa com o conhecimento, mas para a educação infantil e os primeiros anos do ciclo I. E que, com o amadurecimento, sim, a criança teria que se acostumar a fazer níveis progressivos de esforço e sacrifício, já que a relação fundante de amor ao conhecimento estaria dada. Mas a prática pedagógica de massa tem sido exatamente o inverso disso - mata na raiz, na primeira infância, qualquer amor ao conhecimento, incutindo uma disciplina vazia de sentido, autoritária e má, e depois, na adolescência, com esta proliferação do discurso "arte-educacional", do lúdico, do protagonismo juvenil, etc., transforma a escola no lugar onde as crianças vão tocar puteiro, e isso também está errado. Pronto. Já entenderam porque eu fiquei mal-quista, né? Bom. O Tatu, na época , me perguntava assim: Bicho, e hoje, como foi lá no "Brigante"? HAHAHA!!! Para minha salvação, teve uma vez que um menino muito gente fina levantou a questão de classe ali. Ele estava puto - que bom, pensei. Como sempre, e como não poderia deixar de ser, veio como resposta a atual panacéia, o emplastro brás cubas de qualquer problema social contemporâneo: "Estamos inaugurando uma O.N.G...." (Vou escrever sempre assim, com pontinhos entre as letras, para parecer O.V.N.I., que pra mim é muito parecido mesmo). Eu não disse nada. Falar o quê? Além do mais, muita gente boa trabalha em O.N.G., assim como muita gente boa trabalha na televisão, no rádio, no supermercado, na padaria, em casa de família, etc. Mas se eu questionar publicamente as O.N.G.s enquanto solução de qualquer coisa, todos os trabalhadores de O.N.G. vão entender que estão sendo chamados de maus revolucionários, boicotadores do soviete, vão brigar comigo, vão pôr meu pescoço a prêmio - de tudo isso eu até gosto - mas, o que é realmente chato: não vão mais me ouvir (sim, senhores, eu gosto muito de ser ouvida, já o sabeis!). Agora, não percam a paciência, não percam o compromisso com a interlocução, já vou terminar. O que vem é a cereja do bolo: Num dado momento, alguém perguntou para a palestrante: "Escuta, este seu projeto é de educação infantil, as crianças ficam até uns sete anos. Como se dá o prosseguimento desse trabalho pedagógico tão interessante?" - ao que a palestrante respondeu: "No Embu existe uma escola de primeiro grau semelhante, para onde os alunos são encaminhados, o "Projeto A'gora"... (Meu Senhor, porque que hoje em dia tudo tem que ter nome de projeto???). Bom, daí meu compromisso com a verdade (e uma certa inclinação natural para causar espanto e me divertir com isso) falou mais alto, então eu disse: "Eu conheço. Estudei no A'gora." HAHAHAHAHA!!!
Muito engraçado, depois o povo querendo saber mais coisa, dizendo que eu sou assim, que falo o que penso, é porque fui educada naquela fantástica pedagogia... Ué, mas isso não era ruim? Não era inconveniente? Agora fiquei moderna? Ah, que bom, então...
Bom, tudo isso é para mim muito divertido, mas já escrevi demais e não falei da minha crise. Tudo bem, acho que talvez dê pra adivinhar, ou supor. Depois eu falo melhor.
Tchau!

7 comentários:

  1. mas o fato do ágora ser pago não disse nada? (no debate)

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  2. A escola dela também é paga. A ONG para crianças pobres é separada das criancinhas iluministas...

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  3. Pra eles parece que foi a vingança do pipoqueiro...
    E pra você? O feitiço se virou contra o feiticeiro?
    Esta é a crise?

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  4. A crise é que eu valorizo a disciplina, passo o tempo inteiro batendo nesta tecla, mas também não consigo ensinar o mínimo para aqueles seres... humanos!

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  5. Mas isso leva tempo... nesse sentido, a história da 7ª série B da Branca é bem significativa... lembrando, ainda, que tem "os outros" professores que mais atrapalham do que ajudam...

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  6. Ai, menina, sei lá. Ando tão esquisita que quase só dou aulas sentada. Ao invés de dar berros para eles fazerem silêncio, coloco uma cadeira preta confortável que tem aqui em frente à sala, sento, cruzo as pernas e fico olhando como quem diz: "vou me deprimir profundamente". Eles param e ouvem. Mas é meio pesado. As coisas estão muito estranhas, mesmo.

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  7. Sugiro outros posts sobreo Brigante, professora Eulália.

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