quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Querido diário

Final de ano letivo, fechamento de notas, faltas, diários, tarjetas, dos livros de HC, HI, PEA, etc. para preencher e entregar para a chefia imediata. Uma chatice sem fim. Se servisse para alguma coisa até que ficaria razoavelmente satisfeita. Não é este o caso.
Vejamos o caso do ensino fundamental municipal. Durante os tais duzentos dias letivos, muitos professores se ausentaram - a maioria em licença médica - e não existia um professor sequer que os substituísse. As licenças foram informadas para a diretoria de educação, que por não encaminhar professores, deixou muitos alunos sem aula durante meses. Os professores que sobraram na escola se viraram para cobrir as ausências dos demais.
O que então registrar nos diários das disciplinas que não foram ministradas?
Qualquer pessoa com um mínimo de bom senso diria: nada.
Pois então começa a hipocrisia. Todos os diários devem ser preenchidos, com frequências, anotação do conteúdo dado em cada dia, notas apontadas, médias, tudo. Entre os professores se comenta: "Ah! Mas eu que não sou tola de não fazer, senão serei chamada nas férias para terminar!". Como se os alunos tivessem as aulas. É um faz de conta. Uma mentira naturalizada nas escolas.
Uma professora chegou a comentar que na outra escola que trabalha para completar a jornada semanal a cordenadora orienta que se os alunos não tiveram aulas, nada se registra no diário. Pessoa sensata.

Agora imaginemos as condições ideais. Aulas ministradas, todas as informações registradas no diário para acompanhar o processo de aprendizagem dos alunos, sala por sala. Para que serve este registro? O que tem valor, o diário "oficial" ou nossas anotações de aula, que se misturam com os objetivos e as estratégias de ensino?

Na minha escola fazemos conselhos de classe, levantamos os alunos que não podem avançar de nível (série) e entregamos para a coordenação. O que acontece? A diretora manda a cordenadora "passar todo mundo de ano". Passa quem reprovaria por falta, por nota (nas séries finais) e os professores ficam lá, com cara de ué.

Abaixo escolas de mentira, queremos escola de verdade!

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Chave de ouro

Tenho uma aluna na 6ª série A, chamada Luana. Uma das melhores alunas que já tive.
A 6ª série A é a turma que mais gostei de dar aula em toda a minha vida. Por ela, estou com o coração apertado, pois consegui remoção para uma escola pertinho de casa.
Há uns dias encerrei uma aula lá, era a aula antes do intervalo. Quando quase todos saíram da sala, Luana veio ao meu lado, não falou nada, só ficou ali, me olhando arrumar minhas coisas. Achei que ela fosse me perguntar algo, mas... nada. Mais uns segundos de silêncio. De repente ela suspira bem forte. Eu pergunto: "O que foi, querida?", ela diz, olhando pro chão:
- Estou triste...
- Mas porquê?
Chorando, responde:
- É que minha mãe vai me tirar desta escola! Ela me inscreveu no SESI e fui sorteada.
- Mas Luana, lá é muito bom, tantas pessoas gostariam de estar no seu lugar!
- Mas eu quero ficar aqui! Eu adoro todo mundo daqui!
Ficamos conversando por mais um tempo, depois alguns alunos viram o que estava havendo, já sabiam de sua tristeza e vieram também consolá-la e animá-la. Demos um tipo de abraço coletivo. Ela melhorou. Dias se passaram e achei que a tristeza já havia diminuído.
Hoje foi a reunião de pais da 6ªA. Vários alunos e pais presentes, inclusive a Luana e sua mãe. Quando esta foi chamada para receber o boletim de sua filha, comentou que ela será transferida para o SESI, agradeceu a todos os professores pelos 2 anos em que ela esteve conosco. Quando elogiamos sua filha, a mãe se pôs a tagarelar:
- Nossa, ela estuda até demais. Tenho que pedir pra parar de estudar! Se deixar, ela fica lá escrevendo e lendo até meia-noite! Nem assiste televisão!... Sabe, a Luana ama todos vocês, mas já expliquei que será melhor pra ela. Ela disse que de vez em quando quer vir visitar vocês, se ela puder... Meu Deus, ela fala todo tempo de vocês: "mãe, lá na escola professor fez isso, a professora falou aquilo... o professor que todos diziam que era o mais bravo sorriu pra mim... a professora tal tal tal"... Nossa, até me cansa!! Falo pra ela: "Luana, me deixe fazer a janta sossegada!!!"... Ela ama vocês!
A aluna, sentada perto da porta não conseguia parar de chorar. Se levantou, veio se despedir e foi embora com mãe.
Depois de toda aquela cena, fiquei pensando: a maior parte das vezes temos tantos problemas no dia-a-dia escolar, que deixamos de dar conta da importância e do carinho que muitos alunos atribuem à escola e aos professores... Devo ser sincera, eu tinha me esquecido disso nos últimos meses - por falta de atenção - e passei a dar mais poder aos problemas...
Não sou poliana, até gostaria de ser, mas essa história de hoje me deixou tão emocionada!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Síndrome da Aprovação Automática

Síndrome da Aprovação Automática, ou também conhecida como Lei do Menor Esforço, é o que nós professores presenciamos durante todo o ano nos alunos... É absolutamente incrível como a maioria já incorporou o sistema (aliás, incrível que nada... já era absolutamente esperado). Não precisam se esforçar nem um pouco e já passam de ano. É só sentar a bunda na cadeira que passam, esse é o esforço.
Pior é conviver com alunos adultos que mais do que os pequenos, querem se utilizar dessa (des)vantagem.
Semana passada apliquei avaliações de recuperação a vários alunos. Os pequenos já esperavam que ficariam de recuperação, ficaram meio chateados, mas sabiam que não entregaram atividades e tal. Ou entregaram e tiraram nota insuficiente... Até aí tudo bem...
Fui, então, avisar aos alunos de EJA (ai caramba, meu karma!!) quais deveriam recuperar nota. Um ser humínimo que ficou com nota insuficiente se virou e disse: "Mas como eu fiquei com a senhora? Eu venho todos os dias!! Tem gente que vem menos e nem ficou!"... Mostrei meu diário, com as notas insuficientes, expliquei que apesar de estar todos os dias não quer dizer que ele já aprendeu... Blablablá... Bem elegante, mas na real, minha vontade era dizer: "Não é muito estranho você estar todos os dias e ainda tirar nota insuficiente? Sabe por quê? Você dorme e não presta atenção! Senta a bunda na cadeira e acha que já tá bom!"
Não contente, foi falar com a direção, que me apoiou.
Dia da prova, ele sentou na carteira da minha frente: "Professora, ainda não entendi porque fiquei de recuperação! Tem gente que falta mais que eu e passou!"... Aí eu já estava sem paciência: "Homem, eu já te expliquei. Você tirou nota vermelha, não fez o provão da escola e ainda quer passar sem fazer recuperação??"... Ele fez a prova, com consulta, passou, óbvio. Também não ia adiantar se eu o reprovasse, pois está na 7a. e como não é final de ciclo não reprova. Além disso, mesmo que estivesse na 8a., sua reprovação não dependia apenas de mim, lógico.
Voltei pra casa pensando: Como que não tem vergonha?... Adulto, pai, não fez sua parte e não tem consciência disso. A parte que ele fez e tem plena consciência é a de que deve sentar a bunda na cadeira. Enxerga isto como seu único dever, agora, de pedir os "direitos" ele não esqueceu. Postura que vários alunos já incorporaram desse sistema educacional medíocre: Deveres? Que bobagem! São um detalhe sem importância.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

As coisas

"As coisas precisam ser delicadamente escondidas
Para que possam ser encontradas."

Pina Bausch
(reelaboração livre de Simone Melo)

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

EJA, CerEJA, CervEJA, BrotoEJA!

Faço pós-graduação em Educação de Jovens e Adultos. Ontem apliquei o questionário aos meus alunos de EJA, que será analisado em minha monografia. Pedi pra serem os mais sinceros possíveis. Recebi os formulários de volta, respondidos.

Apesar de recorrentemente parar os conteúdos e discutirmos o porquê de aprender tal disciplina, recebi várias respostas de alunos que não sabem e parece que nunca viram nenhuma discussão da importância (ou desimportância) de terem a matéria no currículo... Isso, sem dizer que fiz uma adaptação dos conteúdos à vida deles, ao trabalho, já que praticamente todos são trabalhadores. Pouquíssimos foram os alunos que pensaram pra responder...

Agora com a decepção, me vem o questionamento: o que preciso mudar?? Tá, tá, é todo um sistema educacional problemático, mas ainda quero continuar nele.

Ô, trabalho de formiguinha!

Fala da Professora

Faz muito tempo que queria transcrever aqui esta fala de Marilena Chauí, por dois motivos. O primeiro é o tema, ética, do qual sempre se lança mão no cotidiano escolar, quase sempre com muita carência de uma elaboração que escape ao senso comum - no mau sentido, com seus preconceitos e simplificações que só criam uma emenda pior que o soneto.
Digo isso porque penso mesmo que melhor seria nada dizer a falar o que quase sempre se fala sobre ética nas escolas. Melhor seria não tentar nenhuma aproximação calculada, contentando-nos com os conteúdos de valor implícitos na nossa conduta, em relação aos absurdos "projetos" que se desenvolvem com sentido pretensamente ético - transmissão de filmes americanos em que alguém sofre e depois se salva, ou é salvo por outro, o hábito da reza católica coletiva, não pouco difundido, e por aí afora...). Pois bem. Então, sugiro este texto de fala transcrita para possíveis horários coletivos, quando o tema for nosso conhecido papel de "trabalhar valores". É um começo de conversa que, creio, permite que a coisa saia um pouco da ladainha sentimental de sempre.
O outro motivo é que eu acho bonito, mesmo. Mais bonito é a mulher falando, lógico. Mas minhas capacidades tecnológicas não chegam a tanto...
"Nós somos seres passionais. Nós temos paixões. E as paixões, como o amor, o ódio, a cólera, a vingança, a tristeza, a alegria, a generosidade, elas atuam sobre o nosso caráter. Sobre a nossa índole. E produzem resultados terríveis. Nos colocam desorientados, na vertigem, desvairados, dilacerados, sem saber o que fazer.
A imagem que os antigos usavam pra mostrar o que eram as paixões agindo sobre o nosso caráter, sobre o nosso temperamento, era a de um barquinho solto no mar durante a tempestade. E o barquinho sobe com as ondas, vai pro fundo da água, é arrastado pelos ventos pra direita, pra esquerda, fica sem destino. Fica à deriva.
E é porque as paixões fazem isso conosco que é preciso a educação do nosso temperamento, do nosso caráter, e que é a educação da nossa vontade. A nossa vontade recebendo uma formação racional nos ajuda a escolher entre o bem e o mal, entre o vício e a virtude.
A ética, portanto, é essa educação da vontade pela razão para a vida bela, justa e feliz, à qual nós estamos destinados por natureza."

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Blog de pais de alunos

Vejam este blog: http://www.educaforum.blogspot.com/

EducaFórum

Entre algumas notícias e posts, tem um aviso de uma campanha deles: "Não deixe de denunciar o mau profissional!"...

terça-feira, 25 de novembro de 2008

DESESPERO

Segunda-feira, pós-eleições municipais:

" - Professora, é verdade que o Kassab quer que as crianças fiquem sete horas por dia na escola?"
" - É sim."
" - Ó, Nãããããããããoooooooooo!!!!!!!!!!!!!!"

domingo, 23 de novembro de 2008

ciclo que se encerra

Talvez os companheiros ainda não saibam, mas estou fora de sala de aula a partir desta semana, creio que por dois anos, dedicando-me prioritariamente aos estudos e às nossas reflexões coletivas. Ao longo desse tempo, penso sim em manter a atividade pedagógica num nível laboratorial, mas pra isso preciso ainda encontrar alguém que tope fazê-lo comigo, ou por amor à causa, no tempo livre, ou que use a mesma estratégia que eu - dedique uma parte do tempo financiado pela universidade, em forma de projeto de extensão - formal ou informal, tanto faz.
Então, o ano letivo acabando, tive que apressar o final de semestre, deixando de lado algumas coisas que ainda faria, e antecipando outras. Em seguida, pedi a exoneração.
Não tive coragem de contar para as crianças que estava indo embora. Pedi às minhas colegas que não o fizessem. Ouvi objeções do tipo: "Mas não é melhor falar a verdade logo, você não acha chato ficar enganando as crianças?" Respondi, numa boa de verdade: "Não, não acho. Acho que na verdade a gente já engana, porque não há garantia nenhuma de que ano que vem serei eu a professora deles, qualquer professor da rede que chegar no concurso de remoção tem prioridade sobre mim na escolha das aulas. Além disso, faltam duas semanas para acabar o ano. O que tinha de verdade pra ser feito já foi feito. As crianças são sentimentais, eu também sou sentimental. Quero me despedir deles com alegria, levar e deixar uma lembrança boa, e não sair como a desertora que na verdade não sou." Tudo bem. Ninguém estava interessado em semelhante exposição de motivos, que pareceu supérflua e enfadonha. Mesmo assim fiz questão de dizer. Se alguma das colegas agora resolver prestar um grande serviço à sacrossanta verdade, que o faça sabendo que no fundo é uma sacana de uma fofoqueira.
Às correrias, portanto. Diários de classe: HAHAHAHAHAHAHA!!!! Sempre soube que deveria confiar na minha intuição. Este ano, só de pirraça, não preenchi um (1) puto diário. Havia levantado, ao início do ano, a possibilidade de realizarmos uma chamada por dia em cada classe (e não seis, cada professora fazendo a sua, e tendo por sua vez que fazer seis chamadas por dia!). Nossa escola tem controle de presença, ninguém cabula aula impunemente, há muros grandes, funcionários em número suficiente para saber o que os alunos fazem uma vez lá dentro. Então, argumentava eu na ocasião, para quê dedicar seis vezes mais tempo que o necessário com esta atividade tão desagradável? Houve respostas de vários tipos:
"É assim que eu aprendo os nomes deles."
(Esta na época me desarmava. Eu estava chegando e não sabia o nome de ninguém, mesmo. Mas se fosse hoje, não me desarmaria - passei, de pirraça como disse, o ano todo sem fazer chamada. E aprendi o nome de todo o mundo do mesmo jeito.)
"Eu gosto, estou acostumada. Sempre fiz assim."
(Essa eu rebatia bem. Tentava dizer, polidamente, que, do modo como temos feito, as coisas não andam saindo tão bem a ponto de acharmos que não devemos mudar. Mas mesmo com toda a cortesia de que eu era capaz, essa constatação deixava minhas colegas muito bravas...)
Bem, como tantas vezes, o assunto virou tabu. Em horários coletivos, quando eu falava nisso novamente, algumas mulheres davam uns gritos, outras sussuravam numa língua desconhecida, e eu só ia constatando cada vez mais a semelhança da nossa sala a uma convenção de bruxas. Tá bom, pensei. Eu não vou mais perder tempo com isso, que se dane.
É claro que se eu não controlasse presença, os alunos aos poucos perderiam a confiança naquela fantástica instituição - o que se voltaria também contra mim. Sou contra práticas totalmente individuais num trabalho coletivo por definição. Então, inventei o seguinte: ao invés de fazer chamada, entrava e perguntava para os alunos: "Hoje, quem faltou?". Para evitar mentirinhas, de vez em quando do nada eu aparecia com a lista e fazia a chamada em seguida, confirmando as informações que eles me houvessem passado. Nunca estiveram incorretas: os alunos dessa escola são muito caxias, via de regra. Mas como os diários sempre me saíssem com alguma data errada, faltando dia de reposição de ponte, sobrando dia de reunião pedagógica, essas coisas, então este controle eu fazia nuns cadernos da Moranguinho que comprei no início do ano. E os diários, pensava, faço de uma vez quando pedirem - melhor que ter que refazer tudo e deixar tudo rasurado mil vezes. O diário rasurado é uma bola de neve: quanto mais você erra, mais se confunde, e mais ainda erra.
Bem, retomemos a despedida. Não preenchi um puto diário, e agora é que não preencho mais mesmo, nem perante um decreto assinado pelo Kassab em pessoa. Bom, mas as notas e as faltas eu tinha que passar, não é? Então, pedi primeiro a exoneração, que como eu disse para a diretora, "assim eu fico mais livre pra trabalhar." Daí avisei para as crianças que teríamos prova assim, assim e assado, e fui elaborar as avaliações. Comecei a corrigir as atividades que fizemos ao longo do semestre. Tudo isso foi relativamente simples, uma vez fora da sala de aula (!!!).
O que eu realmente não podia deixar de fazer era apressar a nossa apresentação do coral para os aluninhos de primeira a quarta série. Coisa que eu nunca tinha feito, não tinha idéia de como fazer, mas pensei assim: se elas não perceberem minha insegurança, vai dar tudo certo. Porque qualquer coisa que sair vai ser um pequeno ritual de finalização, uma forma de registrar na vida delas um acontecimento ligado à experiência que tivemos. Então, marcamos a data e uns ensaios adicionais, em que eu iria à escola especialmente e tiraria alguns alunos de sala de aula - "Professora, poooor favoooor, me tira da aula da Romilda!!!"
Quando eu era criança, tive uma professora de piano polonesa. Hoje não sou pianista, creio que porque não estudei teoria musical, e me parece que rapidez de leitura de partitura, conhecimento de harmonia, essas coisas, alavancam, estimulam o estudante a deslanchar - por uma variedade de repertório, mesmo: é chato tocar muito tempo as mesmas coisas. Isso não me incomoda muito. Eu ainda me considero estudante, e artisticamente minha maior afinidade é com música popular. Creio que ainda haverá tempo para conciliar educação e música, este coralzinho foi um ótimo laboratório. Mas se falei da minha professora polonesa é porque, curiosamente, ela se tornou minha grande referência pedagógica prática. Referência, sobretudo, de mescla de afetividade, senso de humor e autoridade. Inúmeras vezes, me apanho imitando pequenos gestos que ela utilizava para lidar com cobranças, chantagens ou mesmo probleminhas emocionais mais corriqueiros dos alunos : "Calma, calma, Eulaliazinha querida, tudo vamos resolver, seremos todos felizes!"
Eu falo até as mesmas frases, uso até as mesmas inversões - "tudo vamos fazer" - que no meu caso ficam ainda mais despropositadas para um observador externo, já que à minha professora era concedida a licença poética de ser estrangeira...
Enfim. No caso do coral, a aproximação afetiva com as meninas foi muito grande, e, contraditoriamente, ali eu precisei que elas fossem muito mais subordinadas e disciplinadas do que em sala de aula. Por isso, ali eu creio ter involuntariamente encarnado a professora polonesa mais do que em qualquer outro momento da minha trajetória pedagógica. Esta deve ter sido a principal razão pela qual ninguém percebeu a verdadeira insegurança que eu sentia o tempo todo.
No dia da apresentação, cheguei à escola e chamei as meninas e o Gabriel. "Vamos ficar aqui, no quintal da cozinha que fica atrás do palco." O palco é outra história: fica no pátio do recreio, em área coberta, no térreo, embaixo das salas de aula. A direção quer derrubar, com o pretexto de construir um refeitório. Alguns professores são contra. Eu havia dito, no início do ano, que queria antes de dar opinião, usar o palco alguma vez, para saber se a acústica do lugar propicia que ele seja útil.
Ali, num quintalzinho que eu nem sabia que existia, ficamos escondidos nos arrumando e ensaiando durante as primeiras aulas e o intervalo. Comemos ali, as merendeiras deixaram nosso lanche separado. Vendo o fuzuê todo, até pessoas que nunca colaboram e em geral fazem cara feia, vieram ajudar - trazendo a sobremesa numa bandejinha, arrumando uns bancos em frente ao palco, não se incomodando com a bagunça. As meninas estavam ansiosas e felizes. O Gabriel, meio triste, parecia ter tido algum problema sério em casa. Algumas meninas escaparam durante o intervalo, todas de roupa preta justa, com uns lenços coloridos no cabelo - que eu comprei na vinte e cinco. Estavam muito bonitas, e eu desconfiei que queriam ser vistas. Saí, fui atrás delas. Os grandes de quinta a oitava vieram me cercando: "Também queremos ver, não é justo não deixarem só por causa de alguns que tiram sarro, nós vamos respeitar..." Essas conversas. Expliquei, pedi para a Célia me ajudar a explicar: foi combinado assim com as coralistas, não posso mudar de idéia agora, seria expor as meninas.
Findo o intervalo, chegaram os pequenos, duas a três salas de cada vez, acompanhados por suas professoras. Conversei com eles, chamei as meninas, cantamos e dançamos. Da segunda vez que estava esperando os pequenos se acomodarem e fazerem silêncio, a Luiza - auxiliar de período - veio me pedir:
"A oitava série queria muito descer e está sem aula... Será que eles podem..."
Respondi: "Nem por todo o chá da China."
Ela saiu rindo.
As meninas de primeira a quarta, no final, vieram conversar. Queriam saber se tinha "lugar pra mais uma."
As professoras ficaram muito impressionadas com a civilidade e o interesse dos seus alunos. Eu fiquei muito feliz.
Trocamos muitos beijinhos e abraços, as coralistas sabem que este ano para mim já acabou. E, que, como eu costumo dizer, o futuro a Deus pertence. Oxalá esta despedida tenha sido algum presságio.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

NÃO SOU APENAS EU QUE VÊ

por vários motivos, não estou indo para a escola por estes dias. mas as informações chegam a mim. publico aqui o depoimento de um aluno, enviado por email.

primeiro ele me perguntou se eu sabia o que havia acontecido na escola na segunda-feira, dia 17 de novembro. eu disse que não, pedi que relatasse. segue infos. enviadas abaixo:

"Foi na segunda feira, [hoje, terça] teve aula normal mas nossa sala está sem luz pois quebraram tudo. A orientaçao foi a mesma dos demais dias [nenhuma] e o fogo foi só um susto pois queimaram as lata de lixo e ainda por cima chovia mais dentro da escola do que fora.

Vou contar os detalhes: Nós tivemos as tres 1°s aulas normais, tudo aconteceu por volta das 9.40h, quando estouraram uma bomba bem do meu lado [durante o intervalo]. A J. entrou em pânico, bom, toda escola entrou em pânico. Eu me lembro que a E. falou pra gente ir pegar nosso material porque estavam quebrando [destruindo todas as lâmpadas] da sala de aula. Ai eu fui pegar, mas não consegui, pois [alunos] estavam jogando carteiras no corredor, ai foi aquela correria. Depois, eu e meus amigos conseguimos pegar, mas ficamos presos na 7°D [última sala deste corredor], com o prof. Fernando, até que escutamos mais bombas e sentimos um forte cheiro de fumaça. Quando fomos ver, estavam aqueles lixos do pátio pegando fogo. Depois de uns 20 minutos a polícia chegou, mas quem começou tudo saiu sem nenhuma preocupaçao pois saiu sorrindo, até que arrumaram a escola. Bem o que eu posso dizer é que estamos com muito medo. Eu particularmente estou muito triste pelo que anda acontecendo mas eu nao posso fazer nada!"

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

pensamento para o dia

Bem ao gosto das colegas professoras, coordenadoras, e dos seres pedagógicos em geral - que costumam ter um caderninho, ou uma pasta na caixa de e-mails, de ensinamentos "fisolóficos", provérbios e reflexões - acabo de elaborar um pensamento mui profundo, e quero dividi-lo com meus estimados amigos:

"Estar cansado de ser pedra e assumir a condição de vidraça pode ser um sinal de amadurecimento."

Agora, pra ficar mais parecido com o início de um horário coletivo, ou com uma mensagem por e-mail mandada pela coordenadora pedagógica da escola, só falta arrumar algum desses autores: Lispector, Shakespeare, Oscar Wilde, Drummond, sei lá! Tem tantos que devem estar se revirando na cova com a publicação póstuma de coisas que escreveram depois de mortos (provavelmente em espírito, e uma educadora psicografou)...

Ou, outra maneira de deixar a coisa transcendental, por assim dizer - pode ter vindo do Oriente, ou ter brotado da sabedoria popular, ou mesmo representar uma verdade inquestionável, quase um axioma:

"Estar cansado de ser pedra e assumir a condição de vidraça pode ser um sinal de amadurecimento."
(Autor desconhecido)

Rapidinha

- Ronaldo, advinha o que tem na minha mão!

- Uma bala!

- Não.

- Uma figurinha!

- Não.

- Uma moeda!

- Não.

- Uma borracha! Um prego! Um giz!

- Não, não, não...

- O que tem então, Eduardo?!

- Um tapa! – “Plah!!!

E foi assim que nós viemos parar na secretaria, mãe, nada demais, eu juro...

- Ah é, seu sonso? “Plah!!!”, “Plah!!!”, “Plah!!!” - E mais uma vez a mãe do Eduardo educou o menino.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

DESISTÊNCIA

Estou num momento culminate - ou fulminante? - da minha curta carreira pedagógica: estou pensando em desistir da escola.

Não em desistir das crianças, dos jovens; meu trabalho com eles vai continuar, em outras vias. Talvez não de uma maneira sistemática, institucional, mas vai continuar. Estou (quase) desistindo mesmo da Escola. Dos adultos que a frequentam e a organizam.

O auge deste meu sentimento/pensamento foi na quinta-feira. Quem acompanha o meu blog já viu: no dia anterior, o DIRETOR quase foi espancado. Na quinta, bombas e confusão. Mas, além da falta de compromisso, irresponsabilidade das pessoas que permitiram que as coisas chegassem a este ponto - não canso de me repetir que nenhum problema começa grande, e acompanho isso - foi este fato: vários dos meus alunos, das sextas, sétimas, e oitavas séries envolvidos, de gaiato, indo de paga-pau de uns moleque metidos a bandidos, e me ignorando totalmente.

O bicho lá pegando, eu tentando apaziguar a situação. Um dos mocinhos sai pra fora, chama a "galera" pra voltar pra escola, pra ajudar a zoar o barraco, os meninos - e meninas, várias! - voltam. Eu olho, muitos dos meus alunos. E daqueles que eu tenho diálogo, tenho uma boa relação; alunos que eu botava fé. Chego junto: - "Fulano, vai pra casa, vai ser melhor. Ciclana, volta, colabora. Ajuda!" E eles? Me ignorando totalmente, como se eu fosse um bosta. Um nada. Um Zé-ninguém.

Talvez eu seja. Só não tinha me dado conta, até agora.

A rasteira foi tamanha que eu estou me recompondo. Aliado às ameaças que recebi quase explícitas de agressão física por conta de alguns alunos que, finalmente, só agora, depois de quase bater no diretor, xingar a Coordenadora, agredirem vários alunos, depredar patrimônio público, não assitirem aula há mais de seis meses, ameaçarem, tocarem o terror, agora, finalmente, foi conseguido uma transferência compulsória - quem disse que não pode? E o problema foi, talvez, resolvido. Não sei, os próximos dias dirão.

Fato é que eu não vou para a escola. Estou em licença médica. Eu me dei. Porque quem gosta de mim sou eu, e eu não mereço o desgaste que estou vivendo há algumas semanas, meses. Não mesmo.

Por isso que estou desistindo da Escola. Principalmente desta escola, que não ensina, não educa, não faz nada; só estraga. Por não ter parceiros, por não ter diálogo. Pelos adultos que lá estão presentes não se responsabilizarem. Cansei de brincar de escolinha. Cansei de fazer jogo sério quando todos não estão nem azul. Cansei.

Por enquanto é da escola, mas não sei. O fato de estar olhando concursos públicos por aí, talvez insinue que eu esteja desistindo da educação. Pela primeira vez estou visualizando que sim, isto é possível. Plausível e acredito que será tranquilo para mim.

Fotos da gincana
















domingo, 16 de novembro de 2008

Gincana cultural na escola

De 10 a 14 de novembro aconteceu na escola que leciono uma gincana cultural que recebeu o nome da escola "1a. Semana Jornalista ...". Foi muito duro fazê-la, ajeitar as coisas pra que tudo acontecesse como pensamos (estou falando na 3a. pessoa do plural, mas não me refiro a TODOS os professores e funcionários da escola, pois apenas uma parcela realmente colocou a mão na massa... Ah, mas vamos deixar isso pra lá nesse momento).

Pedimos que os alunos pesquisassem sobre a vida do patrono, sua obra, sobre história do rádio no Brasil, etc. Pedimos rádios antigos, objetos da época... Ensaiamos os alunos com danças da Jovem Guarda (o tal jornalista trabalhou com artistas da Jovem Guarda e dos Festivais da Record, entre tantas outras coisas que ele fez). Ensaiamos cantoria também. Pra encerrar, fizemos uma gincana estilo "Qual é a música?" do Silvio Santos, além de perguntas sobre as pesquisas que os alunos tiveram que fazer e sobre os acontecimentos do decorrer da semana. Tudo muito divertido.

Dias antes do evento consegui contato com as filhas do patrono, que nos concederam alguns objetos do jornalista. Com eles, resolvi fazer um museu sobre o homem. As filhas, que adoraram nossa iniciativa e ficaram muito honradas, entraram em contato com a Bandeirantes (emissora em que o jornalista também trabalhou) e os repórteres foram cobrir nosso tão honroso evento. O que aconteceu no último dia (14).

Desde o início, os alunos estavam empolgadíssimos, sem saberem que iria emissora. A maioria se empenhou horrores. Ensaios, ensaios, ensaios. Resolvi até fazer um perfil no Orkut só por causa dessa semana, pra que eu e minha sala (que sou coordenadora) nos organizássemos melhor.

Tudo seguindo bem, e na sexta apareceu a Band. Eita! Ficaram contentes demais! Fizeram apresentações, repetiram, enfim.

Conversando com o repórter, me disse que não apareceu na 4a.-feira (dia das apresentações e caracterizações - o dia mais bonito da semana) porque foram cobrir a depredação de uma escola em SP. Triste.

Enfim, os caras foram, filmaram, a semana foi muito boa, e quem quiser assistir, vai passar amanhã (se não for amanhã, será terça, tudo depende da pauta do dia) a partir das 13h.

Beijos a todos e boa noite!

sábado, 15 de novembro de 2008

Mais Uma Terça Feira


Mais uma terça feira na Escola Estadual Antônio Qualquer Coisa, e a inspetora Noêmia roda o molho de chaves no dedo indicador da mão direita, caminhando em direção ao portão de entrada das crianças. “Plah! Plah! Plah!”. Antes de por as mãos no cadeado, já escuta o barulho de tapas ansiosos, no latão pintado de verde. Respira fundo, fecha os olhos, faz uma breve prece pro gerente das religiões cristãs, e pensa consigo: “Hoje vai ser um daqueles dias...”. Todo dia ela pensa isso. Ao abrir a passagem, jorra em fluxo violento um rio de alunos agitados, falando alto, cantando, dando estrelinha, e trocando chutes amistosos que viram no último filme da Seção da Tarde. Tirando o barulho, é uma das cenas mais bonitas que a Dona Noêmia presencia durante a semana, e ela sabe disso. Fica ali parada, segurando as chaves, olhando o relógio, e com um tímido sorrisinho costurado no rosto. Dez minutos depois, fecha o portão, tranca com o cadeado, conduz as turmas para suas respectivas salas, e desce para o pátio, onde ficam os alunos da quinta série, todos sem aula, porque a professora de ciências tirou licença-alguma-coisa. A Dona Noêmia senta os oitenta por cento de nádegas, nos cem por cento de banco do pátio, abre o mini manual de instruções de páginas rosas, e começa a ler algum dos seus salmos preferidos.

Lá do outro lado do colégio, perto da quadra, onde há uma cerca daquelas de metal, tipo um tecido costurado, o grupinho da rua de cima dá um jeito de abrir um buraco bastante conveniente para a entrada na escola. Enquanto a Dona Noêmia molha na língua a ponta do indicador da mão direita, e vira as páginas rosas, os moleques vão abrindo a passagem, e entrando um a um, se misturando com os garotos da quinta.

- Dona Noêmia! Dona Noêmia! O Eduardo tá passando mal!!!

A inspetora fecha o livro, estica a coluna, levanta as sobrancelhas e vai correndo atrás do menino:

- Eduardo! Eduardo! O que você tem, meu filho, o que você fez?! – pergunta Noêmia, puxando pra baixo os olhos do menino tonto, com seus dois polegares.

- Liga não, tiazona, é que ele cheirou cola, mas é fraquinho. Daqui a pouco ele volta... – Diz um outro garoto sem camisa, com uma garrafinha de Coca-Cola vazia, na mão, e mochila preta nas costas.

- Quem é você, menino?! Qual a sua turma?! Que é isso de cheirar cola?! Vão vir todos vocês AGORA pra diretoria comigo! Anda! – irrita-se a inspetora, lembrando, inconscientemente, de que lá na Escola Estadual Padre Sei Lá Das Contas, na Bahia, na época em que ela tirava dez em geografia, não existia essas coisas no pátio do colégio.

Foi um total de, mais ou menos, cento e quarenta dentes, alguns brancos, outros cariados, outros só o espaço na gengiva. A questão é que estavam divididos entre cinco bocas, e todas elas rindo da inspetora, mostrando todo o desdém do poder que um jovem revolto de quinze anos possui, ao invadir o colégio alheio. Dona Noêmia pegou o pequeno Eduardo pela mão, levou até a direção, e esbravejou que não dá pra dar conta “daqueles nóias” sozinha, como ela diz. Conclusão: Subiu o diretor com sua voz imponente, a moça da faxina, com cara de má, e a própria inspetora, apontando quem eram os garotos. Quando o diretor gritou, eles gritaram também:

- Vai se foder, sua bichona! Hahaha!

- Tira a gente daqui então! Hahaha!

- Blablabla, seu %#$@!

O diretor gritou de volta:

- Eu vou chamar a polícia agora!!!

E desceu pisando rápido e pesado, pra sua sala, em direção ao telefone. Rindo, três deles fugiram pela quadra, um pulou o portão de ferro, e o outro... O outro perdeu a festa, porque estava fazendo um xixizinho rápido no banheiro, enquanto tudo aconteceu. A inspetora não perdeu tempo: uniu todos os seus ensinamentos cristãos, colocou todos no bolso da bolsa, e foi correndo trancar a porta do banheiro com o menino dentro. O menino esmurrou a porta, quebrou o rodapé, gritou todos os palavrões que conhecia, usou toda sua criatividade para fazer ameaças, até a ronda escolar chegar ao local. Quando isso aconteceu, os policiais pegaram o garoto, levaram pra delegacia pelo colarinho, levantaram a ficha, fizeram a ocorrência, confiscaram a garrafinha de Coca-Cola, nem tão vazia assim, e conseguiram uma semana de hospedagem para o jovem, na Fundação para Menores Doutor Fulano da Costa.

Depois dos sete dias, o menino saiu de lá, e foi direto pra rua de cima, contar sobre sua aventura. Ganhou a admiração de umas meninas, ficou com fama de mau, cresceu na hierarquia do grupo, diminuiu ainda mais as chances de uma vida mais digna para os próximos anos, e voltou pra porta da mesma escola.

Mais uma terça feira na Escola Estadual Antônio Qualquer Coisa, e a inspetora Noêmia roda o molho de chaves no dedo indicador da mão direita, caminhando em direção ao portão de entrada das crianças...

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Gabriel, a lagartixa

Desde o meio do ano, formamos um grupo vocal na escola. Entre oito e doze meninas - já que a assiduidade não é o forte delas, raramente todas aparecem. Muito prazeroso para mim, apesar dos diversos percalços. Por exemplo, no mês de outubro, quatro dos ensaios (oito mensais, até então) foram cancelados por causa das eleições. Mais uns dois, graças à organização apressada de um campeonato na escola, e à conseqüente debandada dos alunos. Perdemos bastante o ritmo, as meninas estavam desanimando, eu também. Combinei uma conversa com elas, só quatro compareceram. Fiquei sabendo que muitas não se sentiam mais à vontade depois que certas garotas da sétima bê apareceram e, além de não levar a sério o trabalho, ficaram caçoando de quem o fazia. "Pagação de mico, professora". Todo um clima de suspense, de intriga, rumores. A atmosfera desta escola é assim: nada é simples. Tudo bem, vamos desistir, eu disse. É preferível desistir com dignidade, as pessoas assumindo que não querem mais e dizendo por que, a esse constrangimento de todo mundo meio envergonhado, meio sem coragem, enfim. Além do mais, com tão poucas meninas, não dá pra ter a apresentação de fim de semestre que havíamos combinado. Conversa difícil. Estávamos assim, sentadas no palco que fica no pátio, quando chegou uma moça muito querida da oitava série, a Célia:
"Professora, quando vocês vão se apresentar?"
(Que hora ela foi encontrar para fazer a pergunta, meu Deus!)
"Olha, Célia a gente está aqui justamente desistindo. Tem muito pouca gente."
A Célia adora cantar, tinha muita vontade de participar, mas desde o começo, não suportou justamente a tal "pagação de mico". Ficava trepada numa árvore na quadra, olhando a gente ensaiar, sempre morrendo de vontade de entrar na roda. Adolescente. No princípio, eu insisti um pouquinho, fiz chantagem emocional: "Célia, vem aqui, queremos você", essas coisas. Mas tem limite, tem que respeitar o espaço da pessoa. Então, depois de um tempo ela não apareceu mais. Engraçado: quando ela me escutou dizer que estava desistindo, ficou realmente muito incomodada:
"Não, vocês não podem desistir! Tem que ter pelo menos uma apresentação!"
"Mas isso seria expor as meninas, Célia. Me diga, se por acaso fosse você, teria coragem de cantar em número tão pequeno de coralistas?"
"Ah, não, professora, não pode! Então, porque vocês não apresentam só para os pequenos, de primeira a quarta? Aí, não precisa ter vergonha!"
Olhei para as meninas. Elas pareciam menos desoladas do que dois minutos antes. Tive medo de ser só impressão minha, não queria forçar a barra.
"Bom, o que vocês acham da idéia da Célia?"
Como fazem tantas vezes, elas esperaram que eu advinhasse.
"Olhem, eu não consigo ler pensamento. Quero que saibam que eu não me incomodo, respeito qualquer decisão de vocês. Mas se nós decidirmos fazer isso, temos que ter três ensaios semanais, com bastante assiduidade. E eu acompanho vocês com o violão, assim a apresentação fica valorizada - quatro vozes e um violão já é bem bonito."
Toparam, ficaram alegres. Nos ensaios seguintes o clima era diferente, as meninas já tinham em mente todo o tempo a tal apresentação. Avisei, durante as aulas de geografia, que ninguém mais entraria no grupo e que não haveria mais tolerância com quem não levasse a sério o trabalho. Fiz questão de usar a palavra desrespeito na classe em que estavam as meninas que haviam debochado. Então, todo o mundo voltou - inclusive elas, as engraçadinhas da sétima bê. Estas ainda me deixaram perplexa com tanta dignidade: chegaram para o ensaio, sentaram-se e ouviram a professora - muito brava - diante de todas as coralistas - muito mais bravas - perguntar: "Como assim, o que vocês vieram fazer?" Disseram que queriam participar. Então, em seguida, repetiu-se todo o discurso de que ali tal e tal condutas não poderiam mais ser admitidas, etc. etc. etc.
Ficaram, seríssimas. Duas princesas. De lá para cá, são as mais dedicadas. Muito engraçado.
Tudo isso para contar que o final foi um recomeço, e assim, como recomeço, colocamos algumas coisinhas no repertório para animar. E as canções foram tomando forma cênica - as meninas coreografam "As Mariposa", do Adoniran, eu tento dar umas dicas de como elas estão se dando a ver no palco, enfim. Finalmente, incluímos no repertório uma canção gravada por Antônio Nóbrega, o "Coco da Lagartixa". E, como eu sei que menina, via de regra, tem muito problema com a questão do ridículo (se um dia elas forem professoras, passa), sugeri que chamássemos um menino para ser nossa lagartixa. É claro, tinha que ser brincalhão e solto, mas não podia ser alguém incapaz de levar a sério a nossa disciplina, não poderíamos repetir o episódio tão desagradável da "pagação de mico". Pensei em alguns: Gustavo, Malcolm, Daniel, Caique...
Elas queriam o Gabriel.
O Gabriel é um aluno da sexta á, francamente descontrolado. Como, aliás, a sexta série á inteira. Doido de varrer, completamente lelé da cuca. Caso seríssimo. Em sala de aula, a cada três ou quatro segundos seu olhar está fixo num ponto diferente do espaço. Briga de mão, passa pelas outras pessoas e dá tapa na orelha, belisca, sai olhando pro outro lado, disfarça. Senta e se finge de comportado, o olhão arregalado. Só pára de verdade para ouvir leitura de história - para isso, todos param. Já conversei sobre ele com a minha coordenadora nos seguintes termos: não adianta chamar pai, não adianta suspender, não adianta mais brigar. O Gabriel tem que fazer esforço físico. Senão, nada feito.
Enfim, o Gabriel não dá, pensei. Nunca vai respeitar nada. Precisaria de alguns anos de um trabalho pedagógico diferenciado para ele virar gente. Mas também não podia dizer isso pras meninas. Então, tentei enrolar: "Tá bom, eu falo com ele daqui a uns dias, é melhor eu falar..." ("Falo é com outro, isso sim, que eu não sou tatu!").
Vocês sabiam que menina de doze anos lê pensamento? No dia seguinte, certamente por advinhar minhas intenções excludentes e anti-pedagógicas secretas, elas mesmas já tinham falado, ele já tinha topado, já tinham arrumado até uma menina-lagartixa, enfim... tudo dominado. É claro que ele topou, quando soube que alguns ensaios seriam em horário de aula ("Professora, por favor, me tira da aula da Romilda??!!!")...
Ensaio com Vicenza e Gabriel. Gabriel pega o pandeiro: tum tum, chictum, tum tum...
"Gabriel, quem te ensinou a tocar pandeiro?"
"Ah, professora, eu não sei tocar, não..."
(Hum.) Explicações. A canção é assim, a lagartixa entra assim, em tal tempo da música, sai em tal outro...
Gabriel encena: lagartixa bêbada, lagartixa com a saia na cabeça, lagartixa dançando coco que aprendeu a dançar em menos de dez minutos, e a tocar também. Vicenza, uma lagartixa princesa. Todos os dois ouvem tudo com atenção - a professora é mais chata aqui do que na sala. Nada de conversar com ninguém na platéia! Nada de ficar dando tchauzinho! Agora vocês não são mais Gabriel e Vicenza, são duas lagartixas! Gabriel, a lagartixa mais disciplinada que eu já conheci na vida.
Termina o ensaio das lagartixas, chega o coral. As lagartixas não vão embora. Gabriel pega um caxixi. Agora temos dois instrumentos de percussão em todas as canções - ele assume uma vaga no pequeno grupo. Num dado momento, as meninas reclamam: "O Gabriel está mexendo com a gente!"
Ensaio o olhar mais emputecido de que sou capaz. "Olhe para mim. Para mim!!! Será que você é capaz de se comprometer a respeitar as meninas nesta aula? Aqui não tem espaço para este tipo de atitude. Entendido?"
"Entendido". Pela primeira vez, percebo que ele ficou envergonhado.
Terminado o ensaio, as meninas debandam, Gabriel e eu seguimos com o nosso sambinha, tocando e dançando. Ele diz:
"Hoje, sabe qual é a primeira coisa que eu vou fazer quando chegar em casa?"
"O quê?"
"Tomar uma surra!"
"Ué, como assim?"
"Esqueci de avisar que ia ficar aqui..."
"Quer um bilhete no caderno, então?"
"É mesmo, professora, boa idéia!"
(Escrevo o bilhete.)
"Nada de chegar mais tarde, certo, Dom Gabriel? Estou aqui escrevendo o horário em que você saiu do ensaio..."
"Valeu, professora!"
"Tchau, querido."
****
As coisas andam assim, meio invertidas, sabem?

domingo, 9 de novembro de 2008

Espaço e Sentido da Educação - I: escola medievalista

Quando era professora na EMEF Olavo Pezzotti, um dos primeiros grandes dramas foi este: as salas de aula eram ambientes, o que quer dizer que eu ensinava geografia o dia todo no mesmo lugar. À tarde, a mesma sala era ocupada por uma professora carola, daquelas que não dá nem pra saber se já chegaram a ver uma... Bom. Essa ilustre criatura pendurou acima do quadro-negro (ou melhor, do quadro-verde), duas imagens religiosas. Uma era Jesus-Cristo-Bem-Loirinho, cara de artista de cinema, triiiiiiiiiiste que dá pena (um dia desses eu vi uma representação de Jesus Moço Loirinho sorrindo, com cara de surfista. Achei da hora. Mas lá, não, ele sofria, como sempre). A outra, um anjo subindo aos céus, com umas trombetas, umas harpas, coisa muito da importante.
Nem precisa dizer que não dava, eu é que não ia ensinar geografia daquele jeito. Mas, assumindo alguns pressupostos que, depois eu soube, eram meros frutos da minha tola imaginação pedagógica, como o de uma equipe escolar que age num sentido comum, tentei incluir a discussão na pauta das reuniões. Manter a laicidade daquele espaço, pensava eu, não era uma questão competente apenas às aulas de geografia da professora Eulália. Se aquele tipo de apropriação do espaço fosse naturalizada, como se sentiriam os pequeninos que, eventualmente, fossem judeus, muçulmanos, seguidores do candomblé, ateus?
Daí se iniciava a seqüência de presepadas tão peculiares às repartições públicas. Começou assim: eu, muito bestinha, nova na equipe, tendo ingressado no meio de um semestre letivo, meio tímida e meio intimidada, ao invés de falar sobre o assunto, resolvi confiar numa pessoa que até então havia demonstrado bom senso em várias situações e, em tese, estaria numa posição mais confortável que a minha para conduzir um tema polêmico na reunião. Era a Coordenadora Pedagógica. Eu escrevi o tópico num papel da seguinte maneira: "sugiro incluir na pauta: imagens religiosas em sala". Resposta, igualmente num papel: "Pode deixar que resolveremos de maneira silenciosa".
Certo, pensei. Bom, acho que então a maluca sou eu, é isso. Vou esperar que a coisa se resolva de maneira silenciosa, deve ser o mais sensato. Mas, enquanto eu esperava, simplesmente não podia ministrar aulas sobre a origem do universo, o sistema solar, as características do conhecimento científico, sendo vigiada por Cristo e pelos anjos do Apocalipse. Então, para cooperar com a "solução silenciosa", como boa subordinada, eu chegava cinco minutos mais cedo que os alunos na sala, subia numa cadeirinha e - lógico - tirava as duas imagens e as deixava escondidinhas. Ao final do dia, colocava de volta - e pensava que no dia seguinte, se Deus quisesse, elas não estariam mais lá. Assim fiz eu, durante a primeira semana. E a segunda. Mas, lá pelo vigésimo dia, achei que a tal "solução silenciosa" havia sido tomada em prol da Santa Trindade. Então, pra ver o que acontecia, comecei a "esquecer" de colocar de volta na parede Jesus e os Anjos.
Ato contínuo, os rumores começam a se espalhar pela escola. Alguém anda tirando do lugar os quadros da professora Fulana. Logo ela, que se preocupa tanto em trabalhar valores, coisa fundamental, coisa tão séria. Daí, vou descobrindo aos poucos: o professor de matemática, que parecia tão diferente, todos os dias termina o período ligando o aparelho de som, eu chego, "que bonito, professor, um chorinho!", e ele: "ah, tem que sair da mesmice. Eu ponho todos os dias, um dia um choro, um dia um gospel, acho muito importante." E me dá as costas assobiando.
E, no corredor, umas expressões de desconfiança na minha direção. Não demorou nada, os alunos vieram também me perguntar, se Jesus me incomodava, se eu era contra. Não, eu sou cristã, respondia. Mas este espaço não é um templo, e a orientação religiosa da professora não pode preponderar sobre a de ninguém. E por aí a coisa ia.
Até que um dia, descendo as escadarias, deixei escapar numa conversa: "Ora, se a questão é de valores, vou pendurar uma foto do Che Guevara!"
Aí, lascou-se. Tenho até preguiça de tentar lembrar todo o potencial subversivo que minha pessoinha passou a simbolizar. Durante algum tempo, alguns não falavam comigo direito. Como bons fascistas, aproveitavam para se manifestar sempre que estavam em maior número. E sempre com as provocações mais baratas e irritantes. Ao menos para lidar com isso, eu sou bem treinada. As situações eram mais ou menos assim:
"O Lula, aquele analfabeto, você viu agora, que pachorrento, que desaforento?"
"Ladrão, ignorante!"
Aí as pessoas pensam que o esquerdista que está sofrendo assédio moral vai descer do salto. Não pode, nessa hora a gente não desce:
"Por favor, respeitem o meu querido presidente da República. Gostaria de lembrar que estamos numa democracia, ele foi escolhido por mais de cinqüenta por cento dos eleitores. Assim, esta agressão não se dirige a ele, mas à maioria da população brasileira."
"Com você eu não converso, você é ideológica."
E eu, com o máximo de cortesia, às vezes até com carinho:
"Nosso trabalho é coletivo por definição. Sua decisão incorre em carência de profissionalismo. Você não tem esta opção."
E assim se passaram as minhas últimas semanas naquela repartição, toureando de um lado os católicos progressistas dos anos oitenta, do outro os tucanos frustrados por ter que conviver com crianças pobres em troca da "estabilidade" funcional. E, caindo sobre a minha cabeça, os alunos - que só tocavam puteiro.
Saí de lá, pedi exoneração, fui fazer outras coisas. Voltei para a rede no ano seguinte, em outra escola. De lá, só queria algumas folhas de papel vegetal, e uns isopores que eu havia comprado para fazer maquete. Então, meio ano depois de tudo que contei aqui, dou de novo uma passadinha por lá...
A Coordenadora Pedagógica, nem um pouco surpresa com minha visita, como se tivesse me visto ontem, ou há duas horas, pergunta:

"Eulália, você esteve por aqui uns meses atrás?"
"Não, Fulana."
"Não, mesmo, tem certeza?"
"Absoluta. Estive aqui no primeiro semestre do ano passado."
"Tem certeza que você não sabe nada sobre as imagens religiosas que havia nas classes?"
(Havia?)
"Claro que não sei. O que eu vou saber?"
"Sumiram as imagens. Disseram que só podia ter sido você."
(!!!)
"Pode dizer que fui eu, em espírito! Tchau, Fulana!!!"

sábado, 8 de novembro de 2008

RESUMO DA SEMANA ESCOLAR

registro de eventos intra-oficiais de minha escola, que conta algumas histórias, além do cotidiano de preparar aula, corrigir atividades, dar as aulas, etecetera e etecetera:

sexta-feira, 31 de outubro: bateram na porta da minha sala, durante a 5ª aula, para dar uma força para a Coordenação da escola. tinha acontecido uma briga e o pátio estava o Caos. para entender: como a troca de aula de professores na minha escola é novo intervalo para os alunos - todos saem da sala, todas as aulas, inclusive perdemos quase que uns dez minutos em cada início de nova aula - alguns alunos da 8ª estavam com "brincadeirinha de mão" com os alunos da 6ª, os alunos do ensino médio se doeram e começou o pau. voou até um banco de dois metros na cabeça de um aluno e nos pés de outro. algumas turmas foram dispensadas mais cedo. o bicho pegou.

segunda-feira, 03 de novembro: reunião extraordinária entre professores, coordenação e direção. conversamos sobre o ocorrido de sexta, o ocorrido de vários dias, o fato do período manhã estar abandonado, o fato de um grupo de alunos fazerem o que quer sem que nada aconteçam. discutimos, conversamos, alguns falaram. conversa vai, conversa vem. conversa.

terça-feira, 04 de novembro: alunos pegaram a porta de um armário - melhor dizer, arrancaram - e jogaram contra a recém instalada luminária de um corredor. resultado, duas lâmpadas fluorescentes moídas no corredor, luminária amassada. ninguém viu, ninguém sabe quem foi (você acredita em papai noel?). ninguém foi responsabilizado.

quarta-feira, 05 de novembro: aqui eu vou enumerar, se eu lembrar; 1) durante a aula de educação física de uma sala, os alunos estavam na quadra, outros alunos entraram nesta sala, fuçaram nas coisas dos alunos. resultado: levaram dinheiro, outros objetos, e tacaram fogo no lixo. estava indo para outra sala mas vi o que aconteceu na sala: fumaça total, alunos sem condições de entrar, assistir aula. ah, detalhe: a porta do hidrante do corredor ESTAVA AMARRADA COM UM CADARÇO, impossibilitando a sua abertura;

2) como rescaldo ainda da briga de sexta-feira, na qual poucas providências tomadas, nenhuma solução efetiva, um grupo de aproximadamente seis alunos, adolescentes - dezesseis, dezessete anos - espancaram UM aluno de uma sala. isso mesmo, seis contra um. o aluno ficou bem machucado, outros ficaram bem assustados.

e 3) uma pessoa ligada a Coordenação da escola, foi xingada em alto e bom som de: vaca, vadia e vagabunda, além do stress geral que foi a situação.

DETALHE: no dia seguinte, as pessoas envolvidas nestas situações, tanto alunos que bateram ou xingaram, estavam na escola circulando normalmente. pensei em colocar "assistiram aula normalmente", mas estes alunos não assistem as aulas.

quinta-feira, 06 de novembro: depois de EU separar uma briga de adolescentes da 7ª série na saída das aulas, uma professora veio me procurar pois um aluno meu estava no posto de saúde passando mau. aluno meu, mas não foi na minha aula, pergunto: quem deveria dar conta do caso? bom, mas EU não podia me omitir da situação, fui no posto. o aluno estava com uma dor abdominal aguda, a médica que o atendeu não acreditava ser apendicite, mas só um exame podia confirmar. teria que ser levado para um hospital. o hospital de ermelino não tinha ambulância. o SAMU, ATENDENDO POR TELEFONE, DECIDIU QUE O MENINO NÃO CORRIA RISCO DE VIDA, NÃO IA ENVIAR A AMBULÂNCIA. a médica falou se eu não podia levar. sim, eu podia, mas parece que tudo acontece e só procuram EU, EU, EU. bom, EU fui na escola e repassei a situação. não estava em condições de levar ninguém, tinha acabado de separar uma briga, a escola não sou EU, somos TODOS, alguém também poderia levá-lo. conseguimos o transporte. o aluno foi encaminhado ao hospital.

sexta-feira, 07 de novembro. pedi a minha folga TRE, estava um trapo, um fiapo do que poderia ser chamado de ser humano. sem condições de trabalho.

apenas para constar: faço aqui estes relatos pois escrever é a minha terapia, em primeiro lugar. segundo: além de comunicar nos lugares de direito, faço-o aqui para as pessoas saberem do que se passa e, que nenhum problema começa grande, e as tragédias são denunciadas, mas nem sempre isso significa resolver alguma coisa. e terceiro: um livro acho que foi pouco, já estou pensando em escrever um filme.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Elogio

" - Professora, você é de onde, da Bahia ou do Ceará?"

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

É muito doloroso ler sobre tamanhas escrotices acontecendo no interior de nossas escolas públicas. E ainda ter que admitir que não se trata de uma exceção.
Acho que a presença da prof. Eulália evitou que a perda da dignidade chegasse à perda da humanidade (como no caso da aluna que teve o surto). Mas acho que não há lucidez que dê conta de tanta sordidez.
Cada vez menos é possível acreditar nA "HUMANIDADE".

Resta-nos uns aos outros.

sábado, 1 de novembro de 2008

Pra não dizerem que eu só falo de flores...

Acho que quem resolve trabalhar com os pobres, com os mais pobres ainda que a gente, passa muito tempo brincando de "jogo do contente". É normal, é justo, provavelmente é a única forma possível de sobrevivência digna. Mas tem limite. E acho que o limite é esse mesmo, a dignidade. Não só a nossa, não só a do outro. A dignidade de saber que não se está enganando a ninguém. Que não se está enganando a si mesmo.


Parafraseando meu tio Evaldo, que por sua vez diz isso parafraseando um filme cujo nome ele não recorda, a minha história é longa, e muito desinteressante. Vou tentar, portanto, resumir muito: trabalho na educação municipal há três anos e meio, passei pelos mais variados perfis de escola. Cheguei a elaborar uma pequena tipologia:



1. "Escola-várzea-terra-de-ninguém": Não tem direção, absolutamente ninguém se responsabiliza pelo que ocorre lá dentro. Pode ser no centro expandido ou na periferia. A minha ficava bem no meio de uma favela no Heliópolis - o que parecia tornar as coisas um pouco mais complicadas. O nome desta escola, em particular, é EMEF Gonzaguinha. As instalações remetiam a um presídio comandado pelo PCC. Quem dera fosse a única nesta categoria. Tendo a crer que não seja nem mesmo minoria, quem dirá que é exceção....



2. "Escola-bonita-a-fim-de-dar-certo": Era, na época, o CEU Meninos. A estrutura física maravilhosa que nossa querida prefeita deixou, público de periferia, equipe afinada. O ambiente levantava o astral dos alunos, dos habitantes do bairro - já que, mais do que uma escola, o CEU era concebido como espaço público, e, principalmente, o nosso, pois tantos de nós estávamos já quase conformados com a condição de quase carcereiros, conseqüência das costumeiras instalações em forma de presídio. Nesta época, mais que tudo, tive a sorte de trabalhar junto com a maravilhosa professora Branca, deste coletivo. Viajando para lá de busão, nos longos trajetos de ida e volta, foi que nos afinamos tanto em termos de visão e posicionamento prático, teórico, político, filosófico e pedagógico, além das trocas geográficas necessárias. A professora Branca tem sua hipótese sobre a equipe tranqüila e afinada do CEU Meninos: a escola era nova, não havia formado "panelas" de convívio, não havia viciado as estruturas de poder. Não havia ali tantas mágoas acumuladas nas eternas confusões entre vida pública e vida privada do funcionalismo de uma repartição. Eu acho que faz muito sentido. A orientação do trabalho, em uma equipe afinada, é influenciada por todas as diretrizes presentes na ideologia, mas o que acaba sendo mais forte é a prática, a resolução dos problemas que se apresentam numa realidade específica, e isso é bem rico.



3. "Escola-na-crista-da-onda-do-discurso-pedagógico": Era a EMEF Olavo Pezzotti, na Vila Madalena. Sinto que preciso resumir mais. Esta escola tinha o quadro profissional fortemente influenciado pelo pensamento pedagógico, particularmente as tradições católicas dos anos oitenta. Então, o pessoal se esforçava para entender as novas orientações da ciência pedagógica, que resolveriam seus problemas, a diretora, inteligentíssima, procurava estar sempre muito atualizada neste quesito - e o fazia magistralmente. No entanto, esta escola sofria de um mal que eu atribuo justamente à adesão às teorias da ciência educativa: a total falta de limites OBJETIVOS para o comportamento do educando. Como criança não é burra e jovem é outro papo, não demorava muito para os alunos perceberem que ali mandava quem podia (os grandes), obedecia quem tinha juízo (os pequenos), e que os adultos podiam ser visto como uns empecilhos meio chatos, uns maiores, outros menores, alguns como amiguinhos, outros como pinos de boliche, outros ainda como uns cachorros que ficavam latindo no caminho e às vezes mordiam.

Então, na prática, a tal escola-moderna-dos-pobres era muito parecida com aquela, a categoria 1, a terra-de-ninguém. Com a distinção de que aqui os adultos não desertavam, apenas fracassavam de maneira retumbante. Faço também a ressalva de que a realidade com que tive contato foi o curso de quinta a oitava séries, havia umas histórias de que com os pequenos, de tarde, era diferente. Pode ser mesmo verdade, já que, bem ou mal, os pequenos são pequenos, todos menores que os adultos, há objetividade nisto. Além disso, parece que os esforços da direção estavam mais canalizados para as professoras de primeira a quarta.



4. Escola-tradicional-disciplinadora: É nesta que eu trabalho atualmente, pela convicção, formada na prática, de que os limites para o aluno têm que ser objetivos. Esta é a condição mínima para o trabalho, ponto de partida para qualquer ação educacional. Já mencionei esta convicção em outro texto, quando falei sobre assumir a falibilidade - nenhum trabalho pode ser encarado como infalível, ainda mais em se tratando de ser humano. Falar que não pode dar errado, que nenhum aluno pode ser excluído, é um sofisma. Só tem coragem de dizer que não falha quem mente de maneira deslavada.

Bom, isso é um ponto. Baseada nele, fui para lá. Ali, é relativamente fácil construir uma relação tranqüila com os educandos, ocupar o lugar da autoridade, como se diz. Fácil, porque há o indispensável respaldo institucional. Baseada neste mesmo ponto, tenho gastado tempo e energia para unir meus esforços aos de outras pessoas que gostam de ensinar e, pela mesma razão, resolveram estar ali.
Outro ponto é o que acontece, na prática, quando uma escola conservadora assume sua vocação para reformatório...


Terminada a breve (espero ter sido breve) exposição da minha fantástica tipologia, voltemos ao jogo do contente. É o que eu tenho feito todos os dias, para ter êxito em aproveitar o que esta instituição oferece (além do "respaldo disciplinar", que dá chance de tentar de muitos jeitos vencer as dificuldades criadas nos alunos - muitas vezes, criadas pelo próprio "respaldo disciplinar", as ótimas intalações e equipamentos).

Mas agora estou profundamente cansada.

A disciplina vazia de sentido é muito malvada, muito violenta, e eu simplesmente não agüento mais conviver com adultos que trabalham com criança sem gostar de criança, com pobre sem gostar de pobre. Pra tentar resumir a merda que tem sido esse ambiente, só vou contar que esta semana tive que ficar em sala com uma aluna de doze anos que chorava copiosamente por que apanhou da mãe (havia mentido, e roubado cinco reais, me contou no banheiro, pediu pelo amor de deus pra ser ouvida). Ninguém na turma era solidário, ela é muito mal-quista (é discriminada, sobretudo, por sua conduta sexual). O roubo, deduzi, foi para comprar a caixa de chicletes que ela andou distribuindo dois dias antes, para ver se arrumava algum amigo (os outros, que não gostam dela, me contaram isso porque sabem que eu não permito os chicletes). Precisava ela sair dali, então, tentem imaginar a cena: a figura que é motivo de chacota de todo o mundo, chorando sem parar em público, com expressão de dor profunda, e um certo silêncio sorridente da parte de várias pessoinhas (que, com doze anos, já se pode ser bem filho da puta). Meu Deus! Daí, fui tentar providenciar que ela ficasse lendo gibi, sossegada, sozinha, até se acalmar ao menos, ou até que eu pudesse dar mais atenção (eu já havia passado uns dez minutos antes da aula começar junto com ela). A adulta-minha-superiora disse que, no máximo, poderia chamar a mãe. Expliquei para minha superiora que a origem da crise era a relação com a mãe, e que era preferível deixar ao menos aquele desespero passar. Escutei quase uma bronca: "E por acaso você sabe o que ela fez? Sabe POR QUE a mãe bateu nela? ? " Respirei, para ficar mais calma. "Não sei se isso importa agora, e sinceramente gostaria que, enquanto ela não se acalmar, ninguém tentasse falar com ela" Pra terminar o assunto, lembrei da história da Shéslida, dizendo que estou muito traumatizada desde que a menina da oitava série teve um surto ali mesmo, sendo inquerida sobre, não por acaso, um roubo (atentado mais grave que um pobre pode cometer, contra a legítima e sacrossanta propriedade), por esta mesma superiora. A moça tentou se matar, ficou completamente fora de controle, bateu em três adultos grandes ao mesmo tempo, teve que ir sedada para a clínica psiquiátrica. Não apareceu mais na escola. E vejam como os incríveis adultos enfrentaram a questão: a moça é puta, trepa. E agora, ainda rouba. Que fazer?

Que fazer com esses educadores, pergunto eu? O jogo do contente, parece, ultrapassou o limite da indignidade.

Halloween na Bahia

Ontem, as crianças da minha escola estavam em polvorosa com a data comemorativa. Eu, particularmente, recebi cumprimentos em quase todas as salas: "Feliz Halloween, professora!". A cada vez, respondia: "Obrigada, mas... vocês então estão me cumprimentando pelo dia das bruxas?" "Ai, professora, que que é isso?" e eu: "HAHAHAHAHA!!".
Bom, mas aí, como ser politicamente correto que sou, começava a previsível ladainha sobre a origem desta comemoração, sobre a maneira como tomamos contato com ela, sobre a compulsoriedade nem sempre percebida nesta influência cultural. Teve uma sala, a sexta cê, onde eu vivo muito brava, em que eu não resisti e comecei a fala assim: "É claro que eu também gosto de todas as festas, e tenho uma tendência a me sentir particularmente bem no dia das bruxas...", e eles "Aaaaaaaai! Por isso que ela tem aquela risada! Você já ouviu a risada dela?"
E como ser duas vezes politicamente correto que sou, logo em seguida passava a palavra para os alunos:
"Bom, como foi que vocês ficaram sabendo dessa festa?"
(resposta mais ou menos previsível: a televisão.)
"E como é, o que vocês sabem?"
Aí, eu caí do cavalo. Primeiro, a resposta padrão aparecia algumas vezes: "Doces ou travessuras", essa parafernália. Mas, na seqüência, vejam vocês:
"Meu pai disse, professora, que lá na Bahia, na noite do dia das bruxas, nasce uma criança metade gato-metade sereia!"
"E é verdade?"
"Claro que é verdade!"
"É nada!"
"Não, lá na Bahia, no Halloween, se uma menina nasce na família que tem seis meninas, nasce bruxa! Se for menino, e já tiver seis meninos, é lobisomem..."
E continuava.

Resumindo: achei bem chato ter que entrar de novo naquele registro todo politicamente correto, "dia do saci", protesto, tal. Por mim, a gente ficava mais uma semana tentando descobrir como que é o tal Halloween na Bahia. Só não foi mais chato porque no início da aula eu tinha sido meio frouxa, deixado os meninos ficarem de capuz - eu sempre azucrino até que eles tirem. Então, quando a aula estava terminando, eu completava assim: "Então, em homenagem ao saci, Bruno, Luan e Guilherme hoje resolveram ficar o dia inteiro de capuz!" HAHAHA!!!
Eles tiravam na mesma hora.

sábado, 27 de setembro de 2008

SÓ EU VEJO O QUE ACONTECE OU AS COISAS SÓ ACONTECEM COMIGO?

há tempos que eu não chego por aqui. bati o meu recorde sem postagens desta vez. mas é que o negócio chamado 'minha vida' está meio doido. demais. acho que não tive uma semana assim... bom, não lembro em nenhum outro momento da minha vida em que uma semana foi tão cheia de fatos, bons e ruins, marcantes e diversificados para comentar. para ajudar, muitas provas, trabalhos, fechamento do 3º Bimestre, ahhhhhh. pressão total! então, vou tentar fazer um breve resumo da semana, quase que dia-a-dia.

SÁBADO, DIA 20: em pleno sábado, estava na escola. segundo sábado consecutivo, reposição de aulas - da semana da greve. trabalhar no sábado é horrível porque parece que não há interrupção na semana, principalmente para mim que sou professor, é atividade para preparar, aulas, coisas para corrigir quase todos os dias, fora do horário da escola e, trabalhar no sábado. enfim, quase enlouqueci. mas o fato marcante do sábado aconteceu no pós-escola. estou na avenida cangaíba, zona leste, em frente ao comércio dos meus pais - loja de 1,99 - quando do outro lado da rua eu acompanho um senhor: começa a cambalear, tenta agarrar-se a um poste, não consegue, cai e começa a estribuchar no chão, se agitar, como tendo um ataque. algumas pessoas que estão atrás dele, outras vindo pela frente vêem ele caindo no chão, se agitando, desviam o caminho e prosseguem. ele tinha caído em frente a loja de roupas, onde fica exposto alguns manequins (bonecos). um cara que vende côco do lado pula por cima dele, entra na loja, sai, pula por cima dele de novo e volta a vender côco. o cara se estribuchando. sabe o que o cara do côco fez? foi tirar um barato com as vendedoras da loja: -"olha, tem um manequim de vocês caído no chão..."

depois de captar, demorar até para entender o que estava acontecendo, consegui ter a reação de ir lá ajudar o cara. chamamos o resgate que demorou mais de vinte e cinco minutos (!). o senhor estava bem confunso depois que conseguimos fazê-lo sentar. não lembrava direito o nome, onde morava, para onde ia. aí o zé-povinho começou a juntar, fazer muvuca. "ah, a gente pensou que ele caiu de bêbado." e se fosse, não é digno de nossa ajuda? a solução é deixar lá, se debatendo, escorrendo, até a água suja levar (teve gente que sugeriu isto)?

SEGUNDA, DIA 22: tive que retirar um aluno da minha sala (7ªC), pois estava muito rebelde, agressivo, além de estar dando tapas, socos, em outros alunos, rasgou na minha frente e jogou no lixo duas atividades que havia acabado de entregar. fui com o aluno até a direção para registrar o ocorrido, solicitar a convocação dos responsáveis. quando retorno para a sala, a porta está meia-aberta. quando a abro, um cesto de lixo cai na minha cabeça(!). o balde não virou, o que foi pior, pois o fundo - duro - do balde bateu bem na minha testa. o sangue subiu, a vista escureceu, minha vontade foi de xingar, bater, quebrar pelo menos o balde em mil pedacinhos. consegui me segurar, os alunos, parados, assustados, esperando a minha reação. fui calmamente a minha mesa, juntei as minhas coisas, disse "boa sorte para vocês", peguei as minhas coisas e saí da sala. veio uma locomotiva atrás de mim, pedindo desculpas, que o balde não era para mim (era para o aluno que eu havia enviado à direção), que ele tinha feito isso com outro em outro dia, o aluno que colocoou o balde se apresentou mas, estava muito triste, chateado. disse que não interessa que não era para mim, aconteceu comigo e foi muita falta de consideração, respeito. poderia ter me machucado. não estava com ânimo, moral, para voltar para a sala.

o triste de toda esta história é que a 7ªC é uma sala que dá muito trabalho, desde o ano passado. sabemos o motivo: muitos alunos com dificuldades, alunos até não-alfabetizados. mas, não damos conta de educarmos os alunos. o sistema não colabora (sala sempre cheia, alunos não faltam), professores não se ajudam, os alunos não se ajudam e... vai ficando cada vez mais difícil.

a coisa boa da segundona aconteceu a noite. a convite do Michel, Raquel e todo o pessoal do ELO DA CORRENTE, fui até o CEU PÊRA-MARMELO, no Jaraguá, participar de uma atividade literária na Biblioteca Paulo Freire, da escola. Mais de cinquenta alunos da escola e de outras, além de pessoas da comunidade, presentes para conversarmos sobre Educação, Cultura, Literatura, além de apresentações, num Sarau. foi uma atividade muito gostosa, rápida demais, livros foram sorteados - mais de 10 livros - e o pessoal foi muito bacana. valeu Elo da Corrente.

TERÇA, DIA 23: na hora do intervalo, fui procurado por quatro alunas. queriam conversar comigo, em particular. consegui uma sala da escola e fomos. e ouvi coisas simplesmente revoltante: uma aluna pedindo ajuda pois estava sofrendo violência em casa. nada de "tapinhas". espacamento, eu diria que tortura. física, psicológica. não quero contar maiores detalhes pois não sei quem acessa o blog, e também para não expor a aluna/caso. mas terça-feira foi um dia muito difícil para mim, com esta BOMBA-RELÓGIO jogada sobre o meu colo.

QUARTA, DIA 24: digamos que eu tive uma pausa para respirar (se é que pode dizer que ficar mais de quatro horas sentado, corrigindo provas, preparando provas é pausa para respirar). a coisa marcante foi ter acabado o meu papel - inclusive o rascunho - e a tinta (a segunda!) da minha impressora, quando estava imprimindo as provas. sim, pois eu faço e imprimo as provas em casa. nove salas, mais de trezentos alunos. o dinheiro? vem do meu bolso. porque se for esperar tudo do Estado, é bom deitar, sentado eu canso.

QUINTA, DIA 25: estou indo para a minha sala de aula, a 7ªA para aplicar a prova, na primeira aula. dois alunos das 7ªs séries estão se atracando-enforcando no corredor. ninguém separa, ninguém intervém. ninguém viu? separo os alunos, mando para as suas salas. coloco todo o corredor para dentro. entro na minha sala, estou apagando a lousa, ouço e vejo um arrastão passando pelo corredor. alunos da 7ªC e D se batendo, dando socos, tapas, chutes. vou para o corredor atrás - porque parece que as coisas ou só acontecem quando estou lá ou ninguém vê, só eu. esta segunda é a mais provável. identifico nove alunos, das duas salas. falo com cada um deles, não pode ficar assim. a sala está se estranhando há mais de uma semana: juntam alguns alunos no corredor, tipo "gangues" e o pau come. e ninguém vê nada, só eu? detalhe, aqui eu já estou um bagaço, antes de começar a dar a minha aula.

e pra ajudar, durante o intervalo da quinta-feira, teve guerra de comida no intervalo: arroz, feijão, prato, caneca. tudo criou asas, alunos se machucaram, a escola ficou imunda, e eu pensando: primeiro, o que ainda faço aqui? segundo, será que estou ficando louco, só eu vejo, me incomodo com estas coisas? terceiro, o que fazer? sozinho eu não guento. mas não vejo parceiros suficientes ou pessoas interessadas em resolver ao lado. pelo menos não o suficiente, dentro de minha escola. aí é difícil.

principalmente porque esta semana tive que cancelar o encontro com as meninas do meu coletivo-grupo-brancaleone de estudo. meninas, não desistam de mim. eu preciso de vocês, e eu não desisti de vocês. mas é complicado, na escola não tenho muita ajuda, e quem colabora comigo eu não consigo me encontrar...

a coisa boa da quinta-feira foi a QUINTAS AS OITO, evento organizado pelo grupo CLARIÔ DE TEATRO, em seu espaço em Taboão da Serra. toda última quinta-feira do mês, alguém é convidado. e quem chegou por lá foi o pessoal das Edições Toró, inclusive eu, que assistimos a um vídeo, debatemos sobre cultura, educação, literatura - minha praia predileta - lemos, recitamos, nos abraçamos e ficamos felizes. eu preciso disso para recarregar as energias, senão, não aguento.

SEXTA, DIA 26: resumindo a história, fico sabendo de algumas alunas da 7ª série (ÊITA, SÉTIMA SÉRIE), que estão cabulando aula para se reunir na casa alguns meninos para beber, fumar e... trepar. as alunas que me contaram - o bom que pelo menos os alunos confiam em mim - me confidenciaram porque tentam conversar mais as meninas não ouvem. problema grave aí: meninas de treze anos, "desandadas", se nada fazemos, sabemos o que acontece: ou viciadas, ou grávidas. pior, tem alguns jovens, maior de idade envolvidos. mais um bucha na minha mão, e a pergunta que não quer calar: as coisas só acontecem comigo ou só eu vejo o que acontece?

ainda bem que a noite teve lançamento do livro organizado pelo parceiro Alessandro Buzo, "Pelas periferias do Brasil", vol. II, onde eu pude descontrair, encontrar amigos, abraçar, ouvir um som e "acreditar que sonhar sempre é preciso, é o que mantém os irmãos vivos", porque, acho que você entendeu. sózim eu não aguento.

no mais, a média diária de dormida esta semana foi baixa, menos de cinco horas por noite, estou aqui, acabando de compartilhar o texto, para algum doido ou maluca que tenha tempo de ler algo tão grande, identifique-se com as minhas dores e compartilhe um pouco a minha angústia.

"ouçam as histórias de meus males
e curem a sua dor, com a minha dor
pois grandes mágoas, podem curar mágoas"
Luís de Camões

e fechamos por aqui.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Experiência educativa

A mudança para o interior facilitou muito coisas como ir ao teatro, por exemplo. É claro que a programação é bem mais restrita; mas é ótimo poder sair de casa 20 minutos antes, de bicicleta, chegar lá e ainda fazer um lanchinho antes da peça começar...
Lá fomos nós, uma mãe engajada na educação do filho e o próprio com 1 ano e sete meses, ver Dois números - uma peça de teatro de bonecos...
Apesar de um pouco trabalhoso, foi bem divertido. A tal peça não era propriamente infantil, embora não tivesse nada de inadequado para crianças... como o próprio nome diz, eram 2 números, o primeiro com um cordão que era manipulado pelos trê atores compondo formas diversas... bem poético, mas as criancinhas começaram a dispersar um pouco - e os adultos mais ainda. Teve uma hora que o menino do meu lado, com mais ou menos 10 anos, falou algo que expressa bem o sentimento da maioria dos presentes:
_ Não disseram que era de boneco???
Bem, o número foi curto e aí veio o segundo com o tão esperado boneco. Era daquele tipo em que os atores (usando roupa preta e tal...) vão dando movimento cada um segurando numa parte do corpo. Foi um número muito bonito, forte, profundo... basicamente, tratava-se do boneco saindo de suas caixas para explorar e conhecer o mundo e seus manipuladores - super existencial... o que não era a expectativa da maioria ali...
Lá pelas tantas - eu com o pequeno no colo, que sentava, levantava, olhava para todas as direções, fazia carinho na pessoa da cadeira ao lado entre outras coisas - um ser humínimo adulto começou a manipular o seu objeto de tecomunicação portátil bem na nossa frente,; não fazia barulho, mas as luzinhas ficaram todas acesas naquela escuridão e o meu intrépido na hora gritou bem alto:
_ Alôôô!!!
A tal pessoa, só gaurdou rapidamente o objeto...

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Coletivo...quê?

Bom, sabemos que pretendemos consolidar um coletivo na contra-mão do discurso pedagógico vigente, tanto do (neo)liberal, como daquele que se pretende socialista, mas terminou perdendo as duas principais virtudes necessárias a um socialista conseqüente - o senso de realidade, que protege o pensamento contra "esquerdismos", e o senso crítico, que garante aos sujeitos a capacidade de fazer um pouco mais do que reproduzir o que ouviram de catedráticos, especialistas ou patrões.
Nisso concordamos, mas temos dificuldade em encontrar um nome para o grupo, uma vez que não conseguimos pensar em nenuma personalidade a ser homenageada que não acabe nos identificando a grupos sociais ou mais propriamente ideários educacionais dos quais divergimos em pontos cruciais.
Então, por exemplo, Paulo Freire não servia, pois respeitamos o mestre mas não a verenação que certos "estudiosos" incentivam a cultivar por ele (e temos a convicção de que ele também não compartilharia de tal atitude intelectualmente submissa, acrítica e descontextualizada historicamente, que resulta muito mais num congelamento do que num avivamento de suas idéias).
Makarenko também não servia, pois apesar de todo o êxito pedagógico da prática refletida do grande educador soviético, não queremos ser confundidos com os que crêem que se pode pensar um sistema educacional e uma escola socialistas, ou pior, institucionalmente socialistas, num Estado não-socialista.
O nome da educadora Branca Alves de Lima foi levantado por representar, para nós, um resgate do conhecimento técnico do processo pedagógico, o qual é necessariamente fruto de "investigação empírica", ou seja, só pode ser criado na prática por profissionais vocacionados e comprometidos. Em nossa opinião a adoção da cartilha "O Caminho Suave", muito ao contrário de ser uma camisa-de-força didática, era um reconhecimento de que a roda não precisa ser reinventada a duras penas por cada educador que inicia sua trajetória, uma facilitação do trabalho do ensino e da aprendizagem que liberava energia criativa tanto ao educador quanto ao aluno para ir além, no caso de quem quer ir além, e que garantia aos menos criativos (ah, é, eles existem!) alguma tranqüilidade (qual o problema?). Então, pensamos, a homenagem a uma professora comum, daqui do "chão", e a um reconhecimento que, bem ou mal, existia, e deixou de existir, de que o "como ensinar" só pode partir de nós, e não de grandes elocubrações academicistas que nos chovem aos borbotões sob a forma das "formações continuadas".
Então, abri uma pasta na caixa de e-mails com o nome "Coletivo Branca Alves de Lima". Mas ao lado, ali as pastas pequenininhas do lado esquerdo da caixa de entrada, o nome da pasta aparece assim: "Coletivo Branc...". E toda vez que eu leio, eu penso...
COLETIVO BRANCALEONE????"

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Nadando contra a corrente

Semana passada teve um encontro regional da ANPUH, e dentro dele houve o Fórum de Graduação... tema deste? Nova reforma curricular da SEESP e o ensino de história, além disso, também falaram sobre ensino da temática indígena e da África...

A mesa estava composta de pessoas interessantes, mas uma em especial eu sempre fui fã: Helenice Ciampi.

Bem, falaram muito mal da proposta, da qual também não gosto. Muitos ficavam só falando sobre a tal AUTONOMIA do professor, mas não havia, de fato, a discussão de como trabalhar com a tal autonomia, a prática... Era crítica em cima de crítica... "Pra variar"...

Por fim, abriram para as falas, e a maioria começou a fazer discurso inflamado "apeoespiano"... Também quis falar, não pra fazer discurso, mas para perguntar. Fiz perguntas sobre o que seria a tal automia, na prática, pra eles da mesa e se concordam com um currículo mínimo, pois minha vivência, enquanto professora da rede (e aluna do estado do pré até o 3o. colegial), me mostrou o quanto era necessário, até porque essa liberdade total dos professores, pra mim, só gerava bagunça. Apenas uma, a Helenice, disse claramente que era a favor de currículo mínimo... Não me senti tão contemplada por todos, mas, enfim, fiquei sentada ouvindo... Até que foi uma moça que falava muito bem, contra a proposta e tal, mas como vários ali, com o discurso de colocar todos os professores no céu, como se todos fossem sérios... e disse, direcionada a mim: "professora, não temos que ter currículo mínimo não, cada professor tem que fazer o seu"... Uma mulher atrás de mim falou: "eu também acho"... E eu, olhando pra moça com o microfone: "discordo!". Ela foi sentar e todos alvoroçados bateram muitas palmas pra ela (ah, aparentemente, a maioria era de professores das redes).

Enfim, a maioria, tanto de professores quanto de acadêmicos, ali, acham que é autoritário, reacionário, ter um currículo mínimo... Mas em uma conversa com a Professora Eulália, quando estava contando a ela o acontecido nesse fórum, ela falou: "Como se não fosse autoritário o professor, ele só, decidir o que lecionar a seus alunos... Isso é muito pior, é a ditadura do indivíduo!".

Afinal, quem disse que um currículo mínimo, bem discutido anteriormente com a população em geral, não poderia ser melhor? Até porque as discussões nos anos 80 e 90 (CENP, PCN's) já proporcionaram a alguns profissionais da época uma certa habilidade com relação às discussões sobre currículo. E, claro, como era de se esperar, o governo atual foi autoritário sim e passou por cima dessas discussões, ao invés de, com apoio de profissionais e do público em geral, melhorá-las, implementá-las.

Porém, a impressão que dá (não apenas impressão, mas em muitos casos, constatação) é que a maioria dos profissionais prefere a ditadura do indivíduo... Nessa maré, nadamos contra a corrente, como já sabemos há muito tempo, mas é tão difícil não desanimar, né?

sábado, 13 de setembro de 2008

Controle de natalidade e educação


É comum nos discursos eleitorais os candidatos às Prefeituras se referirem à educação com a promessa de aumento no número de vagas, principalmente das creches, pois as mães precisam trabalhar e o Brasil não pode parar.
Como professora pública há mais de seis anos, na periferia da maior cidade do Brasil, constato um fato curioso e preocupante: uma absurda "vontade" de procriação do ser humano e o total descaso com as crianças. Referir-me-ei aqui por ser humano, já que gerar novas vidas, na maior parte das vezes, pressupõe os dois sexos. E esta constatação vem atrelada a outras, como a procriação em função dos relacionamento afetivos, ou seja, engravidar para demarcar território.
Como é de conhecimento de todos, minha filha não foi gerada por meu útero e é filha biológica do meu cônjuge, e isto provoca reações das mais estranhas por parte das pessoas, como acharem que tenho que "ter um filho do meu marido", pois fica parecendo que sou uma trouxa, que cuida do "filho dos outros". Sem contar que é comum ouvirmos cotidianamente que "fulano agora vai segurar o sicrano, pois terá um filho dele". Enfim, enredo de novela da Globo.
Para deixar claro que não estou me referindo especificamente às classes menos abastadas, isto se manifesta em todos os estratos sócio econômicos da população.
E o que acontece depois que os relacionamentos foram definidos por novas gestações? A constatação de que, na grande maioria das vezes, é a mulher que vai se "virar", pois percebeu que o filho será só dela e que o amor de sua vida foi fazer filhinhos com outras. Mas a pessoa não aprendeu ainda, ela vai achar que encontrou novamente um grande amor e engravida novamente, pois ele já tem um filho com outra (um vínculo, para um homem, muito forte por sinal, que o marcou pro resto da vida) e é preciso marcar território mais uma vez, mostrar que a coisa é séria, pra valer.
Você deve achar agora que sou a maior reacionária da face da Terra, não é? Pois digo que não! Sou plenamente favorável às pessoas terem filhos, mas desde que seja por prazer de ter, que não vinculem isso aos relacionamentos-afetivos-demarcação-de-território. Que goste de criança, que curta cuidar, ensinar, dar bronca, aconselhar, errar e aprender. E também não acho que a criança precise de uma família nuclear tradicional.
As crianças das periferias que nascem neste modelo gerado pelas novelas ficam numa situação de abandono não declarado, geralmente tem casa, comida, roupa bem lavada, mas ninguém as assume, ninguém se responsabiliza por elas, elas não se sentem criaturas desejadas por seus pais. Já as classes médias e altas conseguem disfarçar melhor esta situação de abandono com os especialistas contratados para resolverem os problemas, que não são resolvidos por não serem da alçada deles. Mas o que há em comum entre todas as crianças é o fato de serem geradas numa situação que posterga, deixa suspenso, o que vai acontecer com elas futuramente em função das relações estabelecidas entre os pais. Se der certo será uma criança feliz, caso contrário, estará ferrada.
As crianças não devem ter nada a ver com as merdas que seus pais fazem.

Presidente da República, sei que é um tema tabu, mas precisamos fazer um controle de natalidade no país, a começar pelos meios de comunicações, passando pelos postos de saúde, escolas. De que adianta aumentar número de vagas em escolas se além dos muros da escola ninguém se responsabiliza por elas?

Botou filho no mundo, se vire!

domingo, 7 de setembro de 2008

Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come!

Não vejo mais meus companheiros, então vou contar pra eles aqui em público, não tem problema, é até bom.
Estive em uma das discussões organizadas na campanha da Marta, as tais plenárias de educação. Escrevi no papel das identificações que era membro do "Coletivo de Educação Popular - Branca Alves de Lima", na falta de uma definição melhor. Ouvi bastante. A Luiza Erundina falou. A ex-secretária da Educação (provável futura secretária, também) falou. Alguns representantes sindicais, estudantis, alguns candidatos falaram.
Eu, apesar de cultivar grande admiração e respeito por pessoas presentes ali, como a ex-prefeita Luiza, e de ter chegado mesmo à comoção durante sua fala em diversos momentos, discordei de diversos pontos. E pedi a palavra, já que estava ali. O coordenador da mesa já havia avisado que só haveria tempo para a fala de sete pessoas, e abriu as inscrições. Eu fui a terceira a me inscrever. O coordenador leu a lista das sete pessoas que falariam - meu nome não estava nela. Levantei no lugar, olhei para a mesa, ameacei dar um grito, fui inserida na lista. Agora a lista tinha oito inscritos ( ???). Bom, as outras falas eram de pessoas importantes, representativas, vá lá...
Finalmente, peguei o microfone. Aí, fui falando. Comecei dizendo que era eleitora, militante e filiada ao Partido dos Trabalhadores desde os dezesseis - o que é verdade, lógico. Me apresentei como professora de geografia da rede municipal, isso também é verdade. Aliás tudo o que eu falei era verdade, pra encurtar, que assim já está parecendo que eu ia contar alguma mentira!
Então, falei que queria aproveitar aquele momento para dizer que, enquanto professora, não me sinto representada pelos meus sindicatos - isso foi divertido, porque a primeira fala tinha sido de um diretor do Sinpeem! Ele tinha dito que estava muito ansioso pela reabertura da mesa de negociação, que o Kassab fechou, etc. etc. etc. Aí, eu falei que participei ativamente da greve de 2006, que levamos as discussões político-pedagógicas para a população do Heliópolis, que havia questões da mais alta relevância para os caminhos da educação municipal e que tais questões, na ocasião, foram completamente colocadas em segundo plano pelo sindicato. Além disso, há um veto à palavra por parte do sindicato, não se pode ser ouvido nos momentos cruciais. Então, eu disse, se temos a preocupação em levar a cabo uma gestão democrática e popular, é preciso antes de tudo tomar o cuidado de saber quem são os nossos interlocutores. Aí, eu continuei muito séria, e falei que tinha ido até ali com uma preocupação principal. Disse que não sabia direito a que se referia a nossa secretária quando falou que o atual prefeito rasgou e remendou o estatuto do magistério, que eu não entendo nada de questões jurídicas, mas que na minha prática cotidiana observava pela primeira vez um aumento do controle sobre a presença docente na escola. Disse que acho algum controle necessário. Que não falava somente como professora, mas como ex-aluna que se prejudicou muito com as faltas de professores na rede estadual, e como mãe. Disse que se queremos ser democráticos, o primeiro interesse a ser contemplado é o do aluno, e que temos, sim, como educadores, que ver o que as pessoas pensam a nosso respeito. Disse que os sindicatos vão continuar dizendo que o problema não são as faltas, mas a contratação de novos professores. Perguntei onde estariam tantos professores para ser contratados. Enfim, disse que apesar de todo o horror que a atual gestão representa, e eu sei o horror que ela representa, temos que tomar o cuidado de não criticar ações que podem representar melhoras, de não fazer um contraponto pelo contraponto, sem reflexão. Agradeci a atenção e fui para o meu lugar. Ao meu lado, estava sentada uma professora da rede estadual, de Educação Física. Ela disse que a fala foi ótima, que eu consegui ser muito clara, e que na opinião dela eu havia dito as coisas mais importantes. Mas que, enquanto eu falava, a dirigente da Apeoesp que estava sentada em frente a ela sussurou com o candidato a vereador que estava a seu lado: "É a enviada do Kassab!"
É mole?

Eu também vou fazer projeto!

Uma amiga minha acha que devemos procurar o historiador Eric Hobsbawm e sugerir que comece a escrever, seguindo a linhagem de A Era das Revoluções, A Era dos Extremos, A Era do Capital, A Era dos Impérios, um volume de história contemporânea com o título "A Era dos Projetos". Se isso é verdade em geral, no caso do fabuloso universo pedagógico chega a ser a única certeza possível... Então, parafraseando Raul Seixas, já que agora pra fazer sucesso, pra vender disco de protesto, TODO O MUNDO TEM QUE FAZER PROJETO, eu vou tirar meu pé da estrada e vou entrar também nessa jogada, quero ver agora quem é que vai güentar...


Comecei já esta semana mesmo. Queria fazer um grupo vocal, uma coisa muito modesta, mais uma chance de ter um respiro de humanidade no caos que significa a relação de trinta e cinco a quarenta educandos por educador, uma chancezinha de olhar no olho de cada um, fazendo algo que eles concordam que pode ser bom, mas ainda assim exige disciplina, dedicação, subordinação a uma autoridade legítima, essas coisas que a nosso ver podem fazer uma escola ser uma escola e não estão, nem de longe, presentes nas condições gerais do nosso cotidiano. Mas não tinha jeito - se quisesse começar, antes tinha que escrever um projeto - assim me informaram todos os meus superiores hierárquicos. Tá bom, quem sabe começando eu não aprendo, finalmente, o que querem essas pessoas todas do mundo dizer quando anunciam estar desenvolvendo seus respectivos "projetos", as expressões cheias de positividade, transmitindo a crença e a firme convicção de que a maior legitimidade existencial a que pode aspirar um ser humano está em ser o feliz elaborador, executor, ou mesmo avaliador de algum "projeto". Então, não tem problema, vamos também fazer projetos, os projetos substituem todos os paradigmas perdidos. Fiz o projeto, que afortunadamente foi aprovado e está em execução. E a partir de agora, só quero falar na linguagem universal dos projetos, não vou mais perder o bonde da história.

P.S.: Quanto ao coral, está muito divertido, até agora. Só meninas, um ou outro menino quer vir mas não tem coragem! No último encontro, o Gustavo da 5a. A ficou pendurado no muro, espiando a gente escondido...